30 de jan. de 2016

Será mesmo que você escolhe?

Por: Eliana Rezende


Me incomodo quando vejo imensas, e diversas, campanhas publicitárias que no fundo são sempre mais do mesmo.
Elas procuram de todas as maneiras vender-lhe a ideia de que você está escolhendo, o que me parece tão sem sentido!
Explico:

Escolher, por exemplo, um carro entre as cores metálicas (em geral prata), branco, preto ou vermelho? Isso é escolher?
Experimente fazer o exercício de olhar um congestionamento qualquer e verá sempre os mesmos carros (uma ou outra alteração aqui e ali; às vezes uma lanterna, outras uma frente mais ou menos arredondada, mas é só), um amálgama, sempre das mesmas monótonas cores primárias trafegando comprimidamente entre seus 5 lugares. Mesmo por dentro tudo é disposto sempre da mesma forma e maneira.
Motores isso ou aquilo, para quê? Se todos conseguem desenvolver apenas aqueles míseros 20 km/hr nas ruas e avenidas de trânsitos congestionados das grandes cidades?


Observe o mais novo celular que você puder encontrar.
Temos os mesmos botões e posições desde sempre na interface!
Enfadonhamente iguais. Chamam isso de tecnologia amistosa.
Amistosa?! E a tão propalada inovação?!

A cada novo lançamento tenta-se apregoar que você, ao escolher este e não aquele, terá imensas vantagens.
Mas, será mesmo?
Em linhas gerais o que possuem? Teclas para receber e fazer chamadas, botões para fotografar, filmar e mandar mensagens. Enfim mais do mesmo...de novo!

E quando lançou-se a tela touch ninguém quis saber que é terrível estar com os dedos engordurados e passar a mão na tela que você porá no rosto. Que os dedos estão sempre em outros lugares, e que num país tropical, por exemplo, protetores solares, cremes e outros produtos simplesmente transformam estas telas em um emplastro muitas vezes inominável.
A bem da verdade, os celulares em geral, são simplesmente imundos!
Pesquisas da Universidade de Stanford indicam que tais telas são veículos importantes de transmissão de vírus e bactérias comparáveis aos encontrados em descargas de vasos sanitários. 
Ou seja, as telas independente do modelo, ou geração tecnológica, têm em comum um vidro seboso,  embaçado e altamente contaminado nas mãos daquele distinto cavalheiro ali, ou daquela mulher com unhas impecáveis e joias. Definitivamente a imundície é muuuito democrática!
E não falei dos passeios que estes aparelhos fazem direto da pia de um sanitário público para a mesa de um restaurante. Esta também é a escolha que se apresenta: levar o aparelho para TODOS os lugares, ou saber a hora adequada de mantê-lo guardado.

Sugiro a leitura de um post sobre o tema: "Escravos do celular?", onde procurei tecer um perfil comportamental deste tipo de escravidão.

Veja as TVs.
Não conseguimos sair da caixa preta quadrada. Todo mundo oferece a mesma coisa!
E as pessoas, num deslumbramento cego, nem se apercebem de que estão fixados na mesma coisa que seus avós! Em verdade, reproduzem o formato dos rádios que ficavam nas salas dos nossos avós e até bisavós. Ganham dimensão em altura e largura, para serem dispostas em apartamentos que ficam cada vez cada vez menores. As paredes diminuem na exata proporção que as telas aumentam.
Mas porque ainda em formato de retângulo?

E os computadores?
Já passamos mais de uma década e ainda estamos no simulacro de TV de nossos antepassados. A caixinha quadrada está ali. Tudo na mais perfeita semelhança.
O teclado? Vocês com certeza viram máquinas de escrever. Existem há mais de um século! Temos os mesmos teclados e disposições....
Veja algumas no post que escrevi: "Pensados a Tinta escritos à Máquina" e aproveite para apreciar os reclames de venda desta tecnologia. Talvez descubra que de novo temos mais do mesmo na publicidade impressa. 

E que tal falarmos das gerações Windows?
Percebem que desde o inicio temos exatamente a mesma coisa? O que tem sido nosso Word, por exemplo, desde sempre? E o mesmo ocorre com todo o pacote Office.
Ah! mas dirão: há a velocidade X, a capacidade de armazenamento Y... só que na essência continuamos a lidar com a lentidão de processamento de alguns tipos de documentos, e quase sempre nos vemos frustrados que este ou aquele arquivo não abre ou roda....

Ande por lojas, mesmo as que são fast-shopping e verá as mesmas roupas, cortes e afins.
A variação será o preço e o tipo de tecido, melhor ou pior... mas a monotonia de um exército de pessoas vestindo sempre as mesmas coisas e consumindo vorazmente, sempre mais do mesmo, incomoda-me bastante. Vá para a janela mais próxima de uma grande avenida de circulação na hora do almoço. Verá um exército de homens e mulheres vestindo quase sempre as mesmas coisas, e o que é pior: com quase nenhuma ousadia com cores, texturas, bom gosto! Nuvens de preto, azul marinho e branco fornecem "segurança" aos não iniciados na arte de entender que se comunica com o que se veste. E que monotonia nos alcança quando cobrimos nosso corpo de tédio e preguiça criativa.


E a coisa fica ainda pior quando vamos analisar o chamado marketing digital.
De repente, a escolha deixou de ser algo que se espera que o consumidor saiba fazer. Delega-se a algoritmos suas preferências e, cada vez mais, as campanhas ficam uniformes. Todas as vezes que você faz uma busca, os resultados exibidos são sempre os mesmos, porque um dia você foi por esta via. É quase como se estivesse preso a um eterno retorno. Sempre levado aos mesmos lugares e caminhos.


Em outras oportunidades já falei sobre de que forma o Google restringe nossas capacidades de encontrar e interagir com o novo. Confira o post "Se não está no Google, será que existe?". Preste atenção no quanto esta restrição algorítmica retira de todos o encontro com o novo.

A forma e o funcionamento que o marketing digital tem usado torna-nos meros fornecedores de dados. Embalados e empacotados, servem a todo tipo de campanha e é fácil ver nossos e-mails invadidos com publicidade sobre palavras que usamos nesta ou naquela busca.
Deixamos de ser donos de nossas informações e as vemos expostas na rua larga da web.

Todo este desenvolvimento traz como mote que você em verdade não precisa ou não sabe escolher.
O algoritmo saberá melhor que você.


A pergunta que fica é: será mesmo que você não sabe escolher e precisa que outros te digam isso?
Ou, o que é pior: será mesmo que você escolhe alguma coisa?!


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2 comentários:

  1. Sinto falta de um mundo de poucas opções, eramos mais felizes, quando temos variedades demais ficamos perdidos, sempre achando que uma escolha nos tirou outra que talvez fosse melhor. No fundo e tudo bobagem, perdemos uma porção gigantesca do simples, da beleza sutil de não precisar de muita coisa pra estar contente.

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  2. Sinceramente, acho que não escolhemos nada... Uma vez, li um artigo na super interessante sobre exatamente isso: será que escolhemos algo realmente? Então, a conclusão apresentada no artigo é: conhece-te a ti mesmo. Só assim vamos saber escolher algo, ou escolher algo.
    Acho que esse é um dos caminhos. De início, achei a matéria assustadora!

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